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Pelos versos de Florbela

 

 

Florbela Espanca foi aluna do Liceu André de Gouveia. Preservaram-se até hoje os registos da sua passagem por esta instituição de ensino. 
Foi poetisa. Foi mulher e viveu num tempo que não era o seu.

Numa iniciativa da biblioteca e do arquivo escolar, em articulação com a disciplina de Literatura Portuguesa, assinalou-se o 8 de dezembro, data marcante no percurso de vida da poetisa.

As atividades realizadas incluíram a produção de textos, a leitura, o destaque de algumas obras e a exposição de fontes arquivísticas, fotografias, bibliografia e os textos elaborados pelos alunos de 10.º H1 e H2, sob a orientação da professora Teresa Rodrigues.

São esses trabalhos que agora partilhamos com os nossos leitores.

 

Variações sobre sonetos de Florbela

 

EU

 

Eu sou a que no mundo anda perdida,

Eu sou a que na vida não tem norte,

Sou a irmã do Sonho, e desta sorte

Sou a crucificada... a dolorida...

Florbela Espanca

____*____

 

Eu sou a que não sabe o que diz

Eu sou a que não sabe o que faz

Sou a irmã do mar que se desfaz

Sou a crucificada sem juiz…

Mariad

 

Se tu viesses ver-me

 

Se tu viesses ver-me hoje à tardinha,

A essa hora dos mágicos cansaços,

Quando a noite de manso se avizinha,

E me prendesses toda nos teus braços...

 

Quando me lembra: esse sabor que tinha

A tua boca... o eco dos teus passos...

O teu riso de fonte... os teus abraços...

Os teus beijos... a tua mão na minha...

 

Se tu viesses quando, linda e louca,

Traça as linhas dulcíssimas dum beijo

E é de seda vermelha e canta e ri

 

E é como um cravo ao sol a minha boca...

Quando os olhos se me cerram de desejo...

E os meus braços se estendem para ti...

Florbela Espanca

____*____

 

Conseguires ver-me

Que tal conseguires ver-me hoje à tardinha!

Eu tão cheia de mágicos cansaços

Já a noite de manso se avizinha

Queria sentir-me toda nos teus braços…

 

Tudo me lembra esse sabor que tinha

Ouvir de longe o eco dos teus passos…

Beber da tua fonte os teus abraços…

Conseguir ter a tua mão na minha…

 

Ser vista por ti quando linda e louca

Em imagens dulcíssimas dum beijo

É risonha e vermelha e canta e ri

 

Faz-me sentir ao sol a minha boca …

E os dentes se me cerram de desejo…

E os lábios se estendem para ti…

 M. Miguel

____*____

              

 Meu querido amado vem ver-me …

Pela noite que de manso se avizinha

Vem lá ver-me hoje à tardinha

Pela hora dos mágicos cansaços

E eu derreto-me toda nos teus braços!

 

Lembra-me bem esse sabor que tinha

Sentir tão perto o eco dos teus passos

Na fonte eram fortes os teus abraços

E o aquecer da tua mão na minha…

 Fernandete  Encornete

 ____*____

 

 Se tu viesses cedo me encontrar

 

Se tu viesses cedo me encontrar,

A essa hora eu já sorriria

E quando a lua à noite fosse chegar

E me prendesses, eu não fugiria...

 

Quando me quisesses vir visitar

A tua boca então eu beijaria

O teu riso de fazer delirar

Os teus beijos... era o que eu queria!

Amar-al

 ____*____

 

Mistério

 

Gosto de ti, ó chuva, nos beirados,

Dizendo coisas que ninguém entende!

Da tua cantilena se desprende

Um sonho de magia e de pecados.

 

Dos teus pálidos dedos delicados

Uma alada canção palpita e ascende,

Frases que a nossa boca não aprende

Murmúrios por caminhos desolados.

   

Pelo meu rosto branco, sempre frio,

Fazes passar o lúgubre arrepio

Das sensações estranhas, dolorosas...

 Florbela Espanca

____*____

 

Gosto de ti, ó flor do meu jardim

Dizendo coisas boas ao ouvido

Da tua cantilena vem sentido

Um sonho de maravilhas sem fim.

 

Dos teus pálidos lábios algo diz

Uma alada canção no meu ouvido

Frases que guardo como sonho ido

Murmúrios por aquilo que não quis.

 Morga-Alex

____*____

 

Havia uma tal chuva, nos beirados,

Tanta chuva que ninguém entende!

Da antiga memória se desprende

Algo feito de magia e de pecados.

 

Com os teus frágeis dedos delicados

Um toque que palpita e que ascende…

Como muda, nossa boca não aprende

E anda por caminhos desolados…

   

Por um caminho branco, sempre frio,

Faz-me sentir um lúgubre arrepio

Falsas lembranças, estranhas, dolorosas...

 Rita Valido                                                      

____*____

 

Fanatismo

 

Minha alma, de sonhar-te, anda perdida.

Meus olhos andam cegos de te ver.

Não és sequer razão do meu viver

Pois que tu és já toda a minha vida!

 

Não vejo nada assim enlouquecida...

Passo no mundo, meu Amor, a ler

No misterioso livro do teu ser

A mesma história tantas vezes lida!...

 

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa...

Quando me dizem isto, toda a graça

Duma boca divina fala em mim!

 

E, olhos postos em ti, digo de rastros:

"Ah! podem voar mundos, morrer astros,

Que tu és como Deus: princípio e fim!..."

 Florbela Espanca

____*____

 

 Ela anda a sonhar-te, anda perdida.

Os meus olhos andam cegos de te ver.

Sempre foste a razão do meu viver

Aqui entrego já toda a minha vida!

 

Ela deixa-me assim enlouquecida...

Quero dar-te, meu Amor, a ler

O incomparável livro do teu ser

Mostrar que foste tantas vezes lida!...

 

Sei como és fina e frágil, tudo passa...

E tantos dizem isto, toda a graça

Em ti quase divina fala em mim!

 

Vivo em ti, vivo vencido e de rastros:

Vendo morrer mundos, morrer astros,

Que já só peço a Deus: princípio e fim!..

Big Filipe

____*____

 

Minha alma é de dolor e de paixão

Meus olhos já só veem tua loucura

Não és sequer a minha amargura

Pois que tu és cruel e perdição!

 

Não vejo nada nesta escuridão

Passo no mundo pela estrada obscura

No misterioso som dessa procura

A mesma história se repete em vão…

 Isa Soeiro


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